A Economia será a pauta principal das eleições deste ano. Foto: Marcello Casal Jr./ Agência Brasil.

Com uma inflação na casa dos 2 dígitos, a economia virou o foco principal nas eleições de 2022

Era por volta das 17 horas de uma quarta-feira no mês de maio de 2022, quando uma vendedora ambulante entrou em um ônibus no bairro do Comércio em Salvador. A ação, comum no cotidiano de quem usa transporte público, seria considerada normal se, a presença de uma criança ao lado da moça, não chamasse atenção.

Na mão, a vendedora segurava vários caça-palavras para vender no ônibus, na outra conduzia seu filho, que, agitado, soltou-se e começou a percorrer todo o coletivo. A responsável pela criança tentou repreendê-lo várias vezes, mas, sem sucesso, precisou parar as vendas e sentar em um dos bancos do transporte.

Em outra tarde, ainda no mesmo mês e na mesma cidade, desta vez o cenário era uma passarela que ligava o metrô à estação de ônibus, uma família exibia cartazes na tentativa de chamar a atenção dos passageiros que circulavam pelo local.

Os cartazes feitos com pedaços de papelão, diziam “Por favor, ajude a minha família”, quem segurava o papel era um homem alto, ao seu lado um garoto exibia a placa com os mesmos dizeres. Atrás dos dois, uma criança erguia o papel para que as pessoas que vinham na direção oposta pudessem visualizar a mensagem.

Com uma inflação na casa dos dois dígitos, um número elevado de desemprego e o crescimento de trabalhadores, cenas como essa se tornaram comuns na maior parte do país e viraram um retrato da crise econômica que o Brasil vem enfrentando já há alguns anos.

Um levantamento divulgado na quarta-feira (08/06) aponta que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil, a pesquisa foi feita pelo instituto Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) e mostra, ainda, que 58,7% dos brasileiros vivem com insegurança alimentar.

33 milhões de pessoas passam fome no Brasil aponta IBGE. Foto: Agência Brasil/ Arquivo

Com a população enfrentando dificuldades financeiras, a economia virou tema central tanto para o eleitorado quanto para os políticos. “No período eleitoral essa área ganha destaque, já que todas as áreas que envolvem decisões de governos: investimentos; políticas públicas como saúde, educação, assistência social, segurança pública, dentre outros, são aspectos que afetam de forma direta a vida do cidadão comum” explica Antonio Carvalho, Professor de Economia e Finanças da Baiana Business School (BBS).

MOMENTO DELICADO

Com uma inflação de 11,7% em 12 meses, o Brasil registra a quarta maior do mundo, de acordo com um ranking realizado pela Austin Rating. “A inflação é sempre uma inimiga da família, dos cidadãos, pois, retiram destes o poder de compra, impõe sacrifícios, porque, ao ter que comprar menos o consumidor estará sempre diante da difícil decisão que é cortar (não comprar, não consumir), o que reduzir e o que substituir, a cada percentual de aumento dos preços dos bens e serviços.” afirma Antonio.

Segundo o professor de Economia, os combustíveis se tornaram gatilho para inflação, isso porque produtos de consumo básico vêm aumentando cada vez mais nos últimos anos como, por exemplo, gás de cozinha, energia elétrica, alimentos, medicamentos e combustíveis. Com a alta nos preços dos combustíveis, o custo para a produção e transporte aumenta, logo os comerciantes precisam repassar esse acréscimo ao consumidor final.

Fator decisivo para acentuar o momento delicado que a economia vem atravessando, a pandemia provocada pelo vírus da covid-19 fechou empresas, reduziu o quadro de funcionários de organizações e proibiu atividades informais, fonte de renda essencial para o sustento de muitos brasileiros.

De acordo com dados colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a taxa de desemprego está em 11,1% no primeiro trimestre de 2022. “O desemprego é sempre sinal de retração da atividade econômica, ou seja, que há menos empresas, menos negócios funcionando. A pandemia e as restrições impostas pelas autoridades sanitárias para conter e minimizar o seu avanço, resultou no fechamento de empresas e na redução das atividades de muitas outras.” explica Antonio.

Na Bahia, a taxa de desocupação chega a 17,6% no primeiro trimestre de 2022, enquanto em Pernambuco e Rio de Janeiro apresentam 17% e 14,9%, respectivamente, como mostra o IBGE.

Segundo o professor, as altas taxas de desemprego na Bahia e em Pernambuco são efeitos das medidas restritivas adotadas pelos estados durante a pandemia e a concentração da economia no setor de serviços, que corresponde a áreas como turismo e entretenimento. Serviços que só tiveram suas atividades retomadas, após o término da fase mais aguda da pandemia.

O comércio foi um dos serviços mais afetados durante a pandemia. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil.

Apesar do Rio de Janeiro também concentrar na economia, serviços como o turismo, a indústria é um setor com muita musculatura no estado, principalmente a área petrolífera, que sofreu pouco impacto com a pandemia. “É possível atribuir tal desequilíbrio às sucessivas crises políticas que o estado sofreu nos últimos anos, além da crise de segurança pública, que maculam a imagem do estado e geram insegurança para comerciantes, turistas e investidores. “ explica Antonio.

Para Carvalho, apesar do Governo Federal oferecer auxílio emergencial, subsídio às micro e pequenas empresas, antecipação de benefícios e acesso ao FGTS, essas medidas não foram capazes de contemplar os prejuízos que os trabalhadores tiveram durante o período do isolamento.

A ECONOMIA NAS ELEIÇÕES

Para a Mestre em Relações Internacionais e professora de Comunicação e Política do Centro Universitário Jorge Amado (UNIJORGE), Sâmia Franco, a economia será a pauta principal da campanha eleitoral. “A economia tem demonstrado maus resultados nos últimos tempos. A inflação, que é um antigo fantasma da economia brasileira, vide os números galopantes de 1980, voltou a assombrar e a população tem seu poder de compra achatado pela crise. Além disso, com o poder de compra achatado, as pessoas consomem menos e restringem-se ao básico.”

Momentos delicados como este são propícios para a população pousar a sua atenção sobre a economia. “A insatisfação cresce e essa situação se torna instrumento político para medir o alcance da popularidade dos candidatos. O “peso no bolso” será um critério político para a escolha. Então, os candidatos vão recorrer à discussão do tema para tentar angariar simpatizantes ou ainda mesmo diminuir a capacidade de alcance de seu oponente.” explica Sâmia.

Se os eleitores irão ficar atentos à economia, os políticos ficarão mais ainda, principalmente na tentativa de atrair mais votos. Já desenhando como será o seu próximo governo. O ex-presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, tem sinalizado de que, se eleito, irá propor alterações na reforma trabalhista, aprovada em 2018.

De acordo com a professora Sâmia Franco o caminho será longo. Se eleito, Lula precisaria de uma base robusta no legislativo. Depois, o petista precisaria enviar um projeto de lei solicitando a revogação da reforma trabalhista e, em seguida, o PL precisaria ser aprovado, primeiro pelo Câmara dos Deputados e depois pelo Senado Federal.

A reforma trabalhista foi aprovada em 2018 durante o Governo Michel Temer. Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil.

Na sexta-feira (10/06) uma apuração da jornalista Daniela Lima apontou que o ex-presidente havia desistido da ideia de revogar a reforma trabalhista, segundo o presidente do partido, Solidariedade, Paulinho da Força. “É importante sinalizar também que a proposição, feita em período eleitoral, parece que buscou medir o clima da opinião e recebeu uma repercussão importante, e as últimas notícias já sinalizam que o próprio partido, o PT, como recurso discursivo-político, vai mudar a palavra revogação por revisão.” afirma Sâmia.

Recentemente, o Governo Federal garantiu R$ 41 bilhões do Auxílio Brasil, com o pagamento mínimo fixo de R$ 400. Mais R$ 1,9 bilhão para o auxílio do vale-gás, já aprovado. Isso são exemplos do chamado “Pacote de Bondade” que o Planalto vem apostando para minimizar os impactos dos números negativos que a economia tem apresentado e garantir fôlego para o presidente disputar as eleições.

Entretanto, em uma economia frágil, os benefícios deste “pacote de bondade” podem não surtir os efeitos esperados. “Muitas vezes os efeitos desse “pacote” pode não ser sentidos em curto prazo, pois, já estamos a menos de seis meses das eleições. E isso dificultaria o Governo Federal auferir benefícios imediatos. Mas, sem dúvidas, as cifras ganham caráter propagandístico para o jogo eleitoral. O que pode ser capitalizado nas falas e discursos do presidente em sua corrida eleitoral.” diz Sâmia.

Do outro lado do tabuleiro eleitoral, políticos como, a Senadora Simone Tebet (MDB-MS), Sérgio Moro (União Brasil) e o ex-governador de São Paulo, João Dória, são nomes que compõem a chamada “terceira via”. Para a professora Sâmia Franco: “A terceira via tem se mostrado, descompassada com as discussões mais importantes do cenário brasileiro e centrada em formular um nome específico. A incapacidade de lançamento de um nome de capital político para enfrentar os interesses em uma sociedade altamente polarizada tem dificultado a criação dessa chamada “terceira via”.

Com tantas promessas feitas durante a campanha, o eleitor precisa estar atento para não cair em falsas promessas. “Penso que a única saída possível é ficar atento às notícias, compará-las, conversar com pessoas que possam ter um entendimento maior sobre o assunto, acompanhar os feitos do político por outros meios, online ou até presencialmente, para não ser fisgado pelo canto da sereia dos políticos em período eleitoral.” finaliza Sâmia.

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