Foto: Samira Almeida

A força do crédito rural como fibra de desenvolvimento do oeste baiano

Por Samira Almeida

Entenda como o acesso aos financiamentos rurais por parte dos agricultores colabora no fortalecimento da cultura do algodão, uma das principais cadeias produtivas do Cerrado baiano.

Por Samira Almeida

O financiamento é uma operação essencial para quem busca adquirir bens ou serviços visando modernizar ou expandir a capacidade produtiva. Apesar de alguns enxergarem o crédito como uma armadilha, ele se prova uma solução estratégica para empresas que desejam aumentar sua competitividade em um mercado cada vez mais dinâmico.

No agronegócio, os financiamentos rurais desempenham um papel ainda mais profundo, atendendo à crescente demanda dos produtores por crédito com condições acessíveis para investir em novas tecnologias agrícolas e insumos de qualidade. A importância desses recursos financeiros é evidente na Bahia, onde o setor representa 13,7% do PIB total registrado no estado durante o primeiro trimestre de 2024, equivalente a quase R$ 17 bilhões, segundo levantamento da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais baiano (SEI).

As vantagens desses recursos vão muito além do simples ato de liberação do crédito; envolve todo um sistema capaz de potencializar a transformação social e econômica da vida no campo. O processo normalmente começa com a manifestação de interesse do produtor, que encaminha a documentação para análise bancária e avalia se o crédito será utilizado realmente de forma produtiva. A engrenagem de negócios no cenário agrícola conta com diversos atores, desde pequenos produtores, que atua em diferentes segmentos rurais, até os comércios que vendem os insumos colhidos, impulsionando a economia regional.

Cultivos como cana-de-açúcar, café e algodão, em especial, sempre foi uma realidade vivenciada pelos humanos desde os primórdios, desempenhando papéis fundamentais na economia do país desde o Brasil Colônia. Ao passo que a sociedade se desenvolvia, novas técnicas de manejo dos recursos naturais eram exploradas e aperfeiçoadas com base nas necessidades manifestadas em cada período histórico. A demanda crescente levou o governo a implementar estratégias para potencializar essas cadeias produtivas.

Papel das instituições financeiras no desenvolvimento regional

Uma das iniciativas adotadas do governo para reduzir as desigualdades sociais e  econômicas foi a criação de instituições financeiras dedicadas a atender as necessidade de cada uma das regiões do país. O Banco do Brasil (BB), Banco da Amazônia (BASA) e o Banco do Nordeste (BNB) são exemplos disso, sendo responsáveis por administrar os fundos constitucionais.  

Esses fundos, compostos por 3% das arrecadações tributárias federais, como Imposto de Renda (IR) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), funcionam como um intrumento de financiamento para criar programas de desenvolvimento regional. O FNE (Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste) recebe 1,8% desses recursos, valor superior ao FCO (do Centro-Oeste) e FNO (do Norte), que recebem 0,6% cada. Essa diferença se justifica pela necessidades do Nordeste por mudanças mais profundas, uma região marcada historicamente por desafios como a pobreza e longas estiagens no semiárido.

Em particular, o Banco do Nordeste, que administra os recursos do FNE, foi criado para combater essas adversidades e atua como uma chave para o avanço produtivo do território. A instituição direciona esses recursos para linhas de crédito que atendem às principais demandas de diferentes setores produtivos, incluindo o agronegócio, por meio do financiamento de equipamentos agrícolas, despesas relacionadas à produção e à modernização de propriedades rurais, além de oferecer orientações aos produtores quanto ao uso adequado do dinheiro para investimentos no plantio.

O superintendente estadual do BNB na Bahia, Pedro Lima Neto, que representa a instituição em todo o estado, destacou que a atuação do banco na agricultura baiana tem contribuído com transformações significativas no cenário do campo. No território, o Banco já destinou mais de R$ 74,7 milhões durante o primeiro semestre de 2024, os quais R$ 148 mil representam os investimentos realizados para o beneficiamento do insumo.

Segundo ele, o acesso ao crédito trará oportunidades para o agricultor de gerar resultados a longo prazo. “Atuar no agronegócio e na agricultura familiar baiana reflete a concretização da missão do Banco do Nordeste em promover o desenvolvimento da região. O BNB foi o primeiro banco a financiar e acreditar no potencial agrícola da região oeste da Bahia, incentivando a produção sustentável, a mecanização e tecnificação para melhorar a qualidade de vida do agricultor e priorizando o acesso deles ao sistema financeiro”.

Foto: Divulgação/BNB

Cotonicultura no oeste baiano: crescimento e desafios

O gerente do BNB em Luís Eduardo Magalhães, Ticiano Arrais, contou que, durante o início da cultura algodoeira na região, em meados da década de 1980, o banco não financiava a atividade, pois a região ainda não era adaptada para o cultivo do insumo. Na tentativa de impulsionar essa cadeia, ele contou que a alternativa foi criar um fundo de aval, isto é, tipo de garantia oferecida por alguma instituição financeira a produtores rurais ou empresas que não possuem bens suficientes, como imóvel e veículos, para oferecer em um financiamento, em caso de inadimplência.

“Devido ao risco que poderia sofrer nessas operações, o Banco do Nordeste fez um fundo de aval com a AIBA [Associação dos Irrigantes e Produtores do Oeste da Bahia]. Essa associação ajudava colocando um dinheiro nesse fundo para servir de garantia aos produtores que não conseguissem pagar o banco com os financiamentos. No início, só foram financiados 50 hectares; ao decorrer do tempo, foi crescendo para 100, 1000 e, então, não se via mais a necessidade de continuar com o fundo de aval, porque os produtores já tinham garantias para oferecer nas operações bem como não tinham atrasos. Foi a partir desse momento que a parceria do BNB com os produtores da região começou a se consolidar”, explicou Ticiano.

O algodão é uma das atividades apoiadas pela instituição financeira, com forte presença na região. Não é à toa: a Bahia faz parte de uma das três maiores produtoras da Região Nordeste, na frente de Maranhão e Piauí, e ocupa a segunda posição no ranking nacional, conforme estudos do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do BNB (Etene). Ainda segundo a pesquisa, a produção nordestina deve acompanhar a tendência do país, impulsionada pelos bons resultados obtidos na última safra e pela crescente demanda internacional. É estimado que a safra de 2023/24 ultrapasse as 760 mil toneladas de algodão.

O presidente da Associação Baiana de Produtores do Algodão (Abapa), Luiz Carlos Bergamaschi, ressaltou que o oeste baiano oferece condições únicas para a cotonicultura, graças à topografia plana, isto é, um plano horizontal que facilita o planejamento do plantio e colheita, a partir da análise do relevo, drenagem e fertilidade do solo. O bioma do cerrado é o principal responsável por favorecer essas áreas, por ter baixa incidência de pragas e doenças em razão do clima seco e alta luminosidade durante todo o ano – condições essenciais para desenvolver uma produção moderna e eficiente.

“O setor agrícola tem trazido empregos no interior, afetando diretamente o comportamento das comunidades e os resultados locais. Se olharmos para Luís Eduardo Magalhães há 20 anos atrás e compararmos com o que é hoje, vemos o quanto cresceu e se desenvolveu. A agricultura no oeste da Bahia é diferente e não são todos os lugares que são propícios ou competitivos”, conta o presidente.

Foto: Reprodução/Abapa

Ronaldo Vieira, engenheiro agrônomo do Grupo Franciosi, empresa que atua na produção de algodão e soja no oeste da Bahia e no Piauí, reiterou a importância dos investimentos em tecnologias agrícolas “Hoje, o algodão e a soja em sequeiro são produzidos em torno de 4.000 kg por hectare, sem ajuda de irrigação complementar; se você irrigar isso, a produção salta para 5.000 a 6.000kg. Diante disso, o que estamos fazendo? Para aumentar nossas produções de forma sustentável, o Grupo passou a instalar mais sistemas de irrigação complementares, aproveitando a água da chuva que se infiltra no lençol freático a serem utilizadas mesmo após o período das chuvas”.

Iniciativa que transforma: pioneirismo no oeste baiano

Entre os produtores clientes do BNB que se destacam está o Grupo Zanotto, referência no beneficiamento de algodão no oeste da Bahia. A Zanotto Cotton, empresa do grupo, é pioneira em modelo de produtividade e sustentabilidade, processando 15 mil toneladas de pluma por safra – o que equivale a lotar 18 estádios de futebol com capacidade para 50 mil torcedores. 

Essa eficiência é resultado de investimentos contínuos em tecnologia e maquinário modernos, que não só aumentam a produção, mas também geram emprego e renda na região. O algodão processado na unidade de beneficiamento passa por 17 etapas, desde a separação e limpeza até sua comercialização e exportação, com destino final aos mercados nacional e internacional, como China e Índia, maiores consumidores e compradores do insumo.

Cada fardo de pluma é identificado com etiquetas do Sistema Abrapa de Identificação (SAI), um código de barras único que funciona como um tipo de “CPF do algodão”, rastreando informações sobre a unidade produtiva, de beneficiamento e análise no laboratório HVI (High Volume Instrument) da Abapa, que apresenta as características em detalhes e garante a qualidade da pluma processada.

“O algodão que chega aqui passa por um rigoroso processo de beneficiamento. Nossa missão é tratá-lo da melhor forma, separando e limpando adequadamente, porque, às vezes, algo acontece na lavoura e, infelizmente, o material acaba sendo contaminado. Nesses casos, nossa função é separar e beneficiar da melhor maneira possível, além garantir que o produtor consiga comercializar seu algodão de maneira eficaz. Tudo que faz parte do processo de beneficiamento do algodão são aproveitados e nada é descartado”, explicou Fernanda Zanotto, diretora da unidade de beneficiamento da Zanotto Cotton.

Foto: Reprodução/Abapa

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